30 março 2010

BBB, um caso de amor e ódio

Já há mais de dois anos na faculdade de jornalismo, deparei-me várias vezes com críticas ferrenhas ao reality show Big Brother Brasil. Críticas oriundas de outros estudantes e também de professores, que alegam ser um programa que emburrece o ser humano, ao valorizar superfluidades do mundo, como o voyerismo, e subtrai espaços da programação que poderiam ser usados em favor da cultura e educação.

Em contrapartida, de vez em quando, ouço alguns argumentos, não propriamente de defesa, mas de adaptação social. Vou explicar. Já que a sociedade de massa, contemporânea, valoriza, e por vezes banaliza, questões essenciais para o enriquecimento humano, como a propagação da cultura, das artes, de um pensamento crítico sobre a política etc, nós, comunicadores, temos a obrigação de nos adaptarmos ao "sistema", falarmos todas as linguagem, ao ponto de termos que estar por dentro das novidades e tendências de todas as tribos. A diferença que nos separa de meros espectadores é a visão crítica imposta sobre a produção destas atrações, e o distanciamento da alienação que pode ser provocada por estes formatos.

A saída, na minha opinião, não é condenar, sem antes comprovar as sutilezas encobertas pela baixa qualidade da produção, como a possibilidade de um estudo antropólogico da natureza humana, através das relações interpessoais dos participantes, a polemização de assuntos de importância (e omissão) social, como a homossexualidade, o preconceito, a tolerância etc..

É evidente que a maioria das etapas de produção das edições do programa são condenáveis, como a preferência pelos padrões de beleza estipulados pela sociedade moderna, a exacerbada utilização do merchandising, como consequência da superestimação da Indústria Cultural, principalmente por estar inserida numa sociedade de consumo, como a brasileira, e o processo de edição, que valoriza por vezes o politicamente incorreto, a fim de, exclusivamente, conquistar audiência através do sofrimento alheio.

Como confessado na postagem de 17/12/09, em que questiono o resultado final do Ídolos 2009 (veja post completo em
http://1terco3.blogspot.com/2009/12/o-no-novo-idolo-do-bra-brasil.html), adoro acompanhar qualquer tipo de reality show, seja ele musical, esportivo, cultural, entre outros. Não acredito que este prática reduza minha capacidade intelectual, muito menos me emburreça, uma vez que, como já afirmei, a faço com o distancimento necessário para que a alienação provocada por este tipo de programa não interfira no meu cotidiano. Além disso, não deixo de prestigiar algo que realmente me enriqueça para acompanhar um reality show. Considero como um hobby, uma hora de lazer, de entretenimento.

Resolvi discutir este tema, pois, como a maioria sabe, hoje chega ao fim a décima edição do Big Brother Brasil, que, desta vez, bateu todos os recordes possíveis, com indíces de audiência altíssimos e votações que chegaram a casa dos 120 milhões em participação. Duvido que todos os telespectadores do BBB (mais de 60% da população) sejam ignorantes, do ponto de vista intelectual. Prova disso é o próprio apresentador do programa, Pedro Bial, considerado um dos melhores jornalistas do Brasil.

Ser tão radical a ponto de ignorar as tendências de sua própria sociedade é recusar a comunicação. E essa prática surgir exatamente de aspirantes ao jornalismo, ou seja, comunicadores, é, no mínimo, desanimador.

27 março 2010

Coração Louco (2009)

Responsável por dar a Jeff Bridges o Oscar de melhor ator em 2010, o fracassado cantor country Bad Blake, apagado pelos talentos da nova safra, tenta, ao enfrentar inúmeras situações humilhantes, buscar seu lugar ao sol em Coração Louco (2009).

Tomado pela bebida e uma vida totalmente desregrada (comum aos antigos astros country americanos), Blake não tem mais inspiração para compor (o que pode ser a única saída para uma retomada, já que, para interpretar, o público prefere novas caras, como Tommy Sweet (Colin Farrell), pupilo de Blake, por quem ele alimenta um forte rancor, já que Sweet fez sucesso às suas custas, sem a menor gratidão).

Sendo obrigado a tocar em boliches, bares de beira de estrada e outras possilgas, Blake culpa seu empresário, mas sabe que tudo não passa de consequências das suas escolhas durante a vida, de sua falta de planejamento, de seu descontrole. Eis que surge Jeane Craddoc (Maggie Gyllenhaal), uma jornalista de Santa Fé, no sul dos EUA (mais uma das cidadezinhas nas quais Blake foi escalado para cantar), que se aproxima do cantor pela admiração que tem pela música, mas acaba se apaixonando.

Bad percebe que essa não é mais uma daquelas fãs que leva para a cama depois dos shows, mas alguém especial, uma mãe solteira, que cuida sozinha do filho de 4 anos e que tem um sorriso que o encanta. Ela, experiente em relações frustradas, no fundo sabe que irá se decepcionar com o personagem de Bridges, mas resolve arriscar.

E é através desta convivência que Blake descobre o quão irresponsável foi até o momento. A inquietação universal de não ficar sozinho no fim da vida finalmente o assola, fazendo com que tente se afastar da bebida, comece a compor novamente e procure o filho que abandonou há mais de 20 anos.

Um filme sem pretensões tecnológicas, que busca nas interpretações (principalmente na de Jeff) dar sentido ao belíssimo roteiro. Mais uma história de vida, desta vez embalada por uma trilha brilhante, quase que totalmente cantada por Bridges, que se mostrou um ótimo cantor). A fotografia é responsável por belas paisagens do Texas e outros estados do sul dos EUA, nos vários momentos em que o protagonista viaja de cidade em cidade levando sua música aos fãs saudosistas.

Sem comparações a outros filmes "country" (já que eles não entram no meu repertório), Coração Louco é uma lição de vida, de superação. Até no figurino as mudanças de comportamento de Bad são evidenciadas. Das calças abertas, camisas surradas e suadas e cabelo desgrenhado, além da mania de acender um cigarro na bituca de outro, enquanto não larga o copo de bebida vagabunda, Blake passa para uma vestimenta "engomadinha", representando sua vontade de mudança radical de vida, depois de vários atos de arrependimento.

Além do protagonista, há a bela atuação de Gyllenhaal, que se mostra meiga no início do filme e, logo que os problemas começam, passa a demonstrar toda a complexidade dramática que seu personagem pede. Um retrato fiel da garota ingênua e sentimental do interior que se torna forte e independente através dos ensinamentos da vida.

Para quem curte música country, belas atuações e filmes que nos surpreendem pela simplicidade estética, mas uma vastidão interpretativa irão gostar de Coração Louco (o nome do filme em inglês também é Crazy Heart, em razão do nome da música que encerra a trama e representa as angústias semi-resolvidas do protagonista).

CORAÇÃO LOUCO - CRAZY HEART
LANÇAMENTO: EUA (2009)
DIREÇÃO: SCOTT COOPER
GÊNERO: DRAMA
NOTA: 9,0

25 março 2010

It's not too complicated!!

, OEu sempre critiquei comédias românticas por elas traduzirem, numa série de fatores, inúmeros motivos para que você saia do cinema, ou desligue o DVD, sem o menor contentamento ou vontade de repetir a dose. Assim como os livros de auto-ajuda (blá!!), as comédias românticas são doses cavalares de água com açúcar, que pretendem aconselhar, mas acabam deprimindo mais ainda, através de exemplos estereotipados.

Em 2009, porém, me deparei com uma exceção: o filme "500 Dias com Ela", do estreante Marc Webb, que trata com realismo e honestidade o amor e seus efeitos nas pessoas. “Uma história de amor que tem como pressuposto não contar uma história de amor”, como o próprio protagonista desabafa no início do filme. Recomendadíssimo!!

Fiquei feliz ao decepcionar meu preconceito...

Com a mesma sensação, fui ao cinema esta semana assistir Simplesmente Complicado, da melosíssima Nancy Meyers, confiante num roteiro que fugisse das convenções sentimentais que assolam o cinema hollywoodiano, e as suas próprias obras anteriores, como O Pai da Noiva 2 (1995) e Alguém tem que Ceder (2003). Mas me enganei. Meu preconceito foi corroborado pela sequência de inutilidades exibida.

Jane (Meryl Streep) é mãe de três filhos e está celebrando 10 anos de sua separação com o advogado Jake (Alec Baldwin), com quem mantém uma relação aparentemente amistosa, quando, na festa de formatura do filho mais novo, bebe além da conta a acaba na cama com o ex-marido!

O problema é que o personagem de Baldwin está casado com outra mulher (bem mais jovem que Jane) e, a partir desta relação casual, começa a se “reapaixonar” pela ex. Porém os dois não contavam com a aparição de Adam (Steve Martin), arquiteto de Jane, que também se apaixona pela protagonista (arquiteto este que, ao reformar a casa de Jane, busca, numa metáfora medíocre, reformar a própria vida da protagonista...coisas de Meyers!)

O filme todo é uma terapia, com longos conselhos, aflições, angústias da meia idade(e as caras e bocas de Streep). Ouso reclassificar o longa como um Romance-Cômico, já que as nuances românticas/dramáticas são mais trabalhadas do que propriamente a comédia, mesmo que num tom claramente superficial, cujos cenários são repletos de representantes clássicos da burguesia americana, ignorando a existência das outras classes sociais.

A sequência de conflitos familiares poderia ter sido mais bem aproveitada, no que diz respeito a profundidade na abordagem destes conflitos, já que, assim como o próprio nome do filme sugere, mas não cumpre, a vida, e suas relações e sentimentos, é por vezes simples, ao mesmo tempo em que bem complicada.

Situações “clichê” são frequentemente retomadas, através de uma irritante enxurrada de estereótipos, como o grupo de amigas que se reúnem depois da transa para falar mal do ex da afetada, a protagonista que já sabe o que fazer, mas recorre ao amigo-terapeuta só para preencher cenas, a insegurança dos personagens que já passaram dos 40, ou 50, diante do risco de perderem seus parceiros para jovens sedutores etc.

Destaco como o ÚNICO motivo interessante para reservar 120 minutos do deu tempo assistindo Simplesmente Complicado é a atuação de Meryl Streep, que continua absorvendo todo e qualquer personagem e conseguindo transmitir a carga dramática que ele possui (mesmo que isso signifique representar uma madame supérflua e presa aos conceitos do “branco-rico”).

Parece que algo de Julie Child (último personagem de Meryl no cinema, no filme Julie & Julia, de 2009) ainda permanece na atriz, que se mostra habilmente treinada na gastronomia (também francesa!) como dona de uma padaria de luxo. É uma pena que um talento como o dela seja desperdiçado num texto tão pobre!!

Steve Martin parece que gravita numa outra dimensão durante o filme. Absorto na tentativa de não fazer o público rir (já que interpreta um divorciado/nerd/tímido), ele não atua, vegeta. Seu potencial emerge quando a comédia ganha um destaque, mas logo afunda no seu lago do esquecimento novamente.

Um filme fraco, do ponto de vista crítico, mas que ganha nas atuações (inclusive de Alec Baldwin e seu jeito canastrão de ser) e no aspecto comercial, já que Nancy Meyers consegue, mais uma vez, atingir seu público alvo, as “senhoras” de meia idade, que se identificam com Jane, e podem sonhar durante a sessão em serem disputadas por dois homens ao mesmo tempo (talvez esse seja o sonho da diretora, que insiste tanto nesse tema).

Qual será a próxima empreitada de Meyers? Quem sabe ela não se junte a Stephanie Meyer (que, ironicamente, tem o mesmo sobrenome) e as duas lancem uma série de TV, ou um filme sobre os conflitos dos vampiros amantes e sensíveis de meia idade...pelo menos conseguem lotar as salas de cinema....

OBS: Acho que eu era o único expectador abaixo dos 40 anos na sala (e um dos poucos homens)...

SIMPLESMENTE COMPLICADO - IT'S COMPLICATED

LANÇAMENTO - EUA (2009)
DIRETOR: NANCY MEYERS
GÊNERO: COMÉDIA ROMÂNTICA
NOTA: 6,0

23 março 2010

Obrigação (quase) obrigatória!

Para quem não viu, o Especial da TV Cultura da última quinta-feira exibiu duas entrevistas antológicas da década de 70 da cantora Elis Regina. Ela foi convidada a responder perguntas de seus fãs nos programas Vox Populi e MPB Brasil. As entrevistas foram exibidas das 23h à meia noite e apenas confirmaram o temperamento explosivo de Elis, que não poupou palavras e ironia nas respostas.

Uma das mais presentes considerações da cantora foram as críticas à Indústria Cultural e seus efeitos na indústria fonográfica brasileira, com a invasão de modelos norteamericanos (não só na música, mas em todas as manifestações culturais). A constante frequência deste assunto se deu pela permanência do tema nas perguntas das pessoas na rua.

Dá pra perceber que todos tinham consciência que Elis era fortemente ativista, ou seja, participava com frequência das discussões sobre a sociedade da época. Durante toda sua curta carreira, ela foi responsável por afirmações rígidas, comprometedoras e pertinentes às mazelas sociais que assolavam não somente o Brasil.

Dois dias depois, no sábado, estava eu assistindo Lobotomia, o programa de entrevistas do cantor Lobão, na MTV, com a participação do vocalista do Detonautas, Tico Santa Cruz, quando o mesmo assunto veio à tona: enquanto falavam sobre o conceito de homofobia
e a suspeita de o Dourado, do BBB, ser homofóbico ou não, Tico alertou o público sobre a necessidade de os artistas, por terem a publicidade a seu favor, serem ativistas.

A partir deste argumento, comecei a pensar se apenas o fato de uma pessoa ser pública a obriga a expor suas opiniões em campanhas reivindicatórias. É evidente que inúmeros artistas promovam discussões e incentivem diversos tipos de mudanças, mas isso é essencial para uma carreira artística e desqualifica a pessoa que se recusa a se posicionar?

Um exemplo típíco da descriminação pública contra artistas que não se mantém firmes nas suas ideias e não as expõe frequentemente é a chuva de críticas feitas à cantora Maria Rita no ano passado por ela não ser tão ativista quanto a mãe. Para se ter uma ideia, os que se revelaram contra a posição contida de Maria Rita duvidaram até do talento da cantora, criticando suas potencialidades vocais: uma manifestação descabida! (É importante ressaltar que desde o ano passado, Maria Rita está engajada na campanha Doe um Livro, pelo Twitter, que já arrecadou quase 80 mil livros usados, que estão sendo doados por livrarias pelo país).

Para mim, há duas possibilidades de os artistas se manifestarem sobre algum assunto de interesse social. Primeiramente, nos seus próprios trabalhos (críticas embutidas nas músicas, como na Ditadura Militar, na época da Tropicália, da Marginália, os RAP's “sociais” das periferias, no movimento hippie; livros que retratam a realidade da sociedade, de forma a manifestar alguma crítica, mesmo que subentendida; obras de arte que materializam alguma reivindicação, como os parangolés de Hélio Oiticica, as pinturas de Tarsila do Amaral e dos outros artistas da Semana de Arte Moderna etc.). Ao lado, a obra "380 Mortos e Desaparecidos da Ditadura Militar no Brasil", de Henrique Macedo.

Em segundo lugar, em trabalhos (voluntários) alternativos, que satisfazem os princípios morais e éticos dos artistas, além de alavancar suas carreiras, como era o caso de Elis (que usava as duas possibilidades), a campanha Amazônia Para Sempre, que Christiane Torloni propaga pelo país há tempos, as diversas ONG's que são agraciadas pelo capital e apoio de inúmeras celebridades etc.

Atualmente, a tecnologia torna possível o ciberativismo, ou seja, a propagação de ideias e críticas sociais virtualmente, através da internet. Com esta possibilidade, é inevitável o aumento da participação dos artistas em campanhas. Mas fica a minha posição: mesmo que não haja esse aumento, não é obrigação de ninguém (mesmo que seja conveniente) expor ideias libertárias, revolucionárias, críticas ou reivindicatórias.

E você, acha que todo artista ou pessoa pública tem a obrigação de usar seu espaço na mídia para expor ou propagar suas opiniões sobre as questões sociais?